Uma reunião ocorrida na semana passada gerou expectativas sobre a abertura de turmas de Medicina na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) destinadas a assentados da reforma agrária. O encontro entre a reitoria da universidade, representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e da Faculdade de Medicina, Psicologia e Terapia Ocupacional (Famed) representa um primeiro passo para essa iniciativa, que seguirá os moldes das turmas especiais já existentes no Curso de Medicina Veterinária.
A UFPel serviu como referência para a abertura dessas turmas especiais em Medicina, pois até o momento 139 profissionais oriundos de assentamentos da reforma agrária já se formaram em Medicina Veterinária pela universidade. Neste ano, a quinta turma especial foi iniciada. Caso as turmas especiais de Medicina se concretizem, o financiamento será realizado através do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera), vinculado ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), vinculado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário. Isso significa que os recursos não serão provenientes do Ministério da Educação, que financia a maior parte das atividades da UFPel.
Além do curso de Medicina Veterinária na UFPel, o Pronera já oferece cursos em diversas áreas e em diversas universidades federais do país, como Agronomia, Geografia e Serviço Social. As turmas do Pronera possuem um processo seletivo específico e não implicam na redução das vagas já existentes.
A reitora da UFPel, Isabela Andrade, afirmou que o projeto está em uma fase inicial e deve passar por várias instâncias antes de ser implementado. Segundo ela, a iniciativa é "um instrumento para reduzir as disparidades no acesso à educação e aumentar a representatividade de profissionais de saúde em áreas rurais, onde geralmente há escassez de médicos".
"A experiência já acumulada nas cinco turmas especiais nos trouxe aprendizados sobre como conduzido uma iniciativa como essa", afirmou a reitora, referindo-se ao modelo já implementado nas turmas de Medicina Veterinária.
Diego Gonçalves, mestre em Política Social e Direitos Humanos e colaborador do MST para políticas públicas, participou da reunião com a reitoria e mencionou que o processo exige diálogo com vários setores da universidade. Ele explicou que a busca por turmas especiais para assentados da reforma agrária surge da necessidade de levar profissionais para áreas consideradas de difícil acesso. "O Pronera existe desde 1997, no governo Fernando Henrique Cardoso. Não estamos inventando nada, queremos seguir em frente", destacou.
Reação da classe médica No entanto, a discussão em torno da criação dessas turmas especiais gerou reação por parte da classe médica, que criticou o anúncio. O Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) emitiu uma nota pública repudiando a possibilidade de criação do curso de Medicina destinado à população cadastrada pelo Incra. O sindicato argumenta ser contrário à expansão de vagas "sem parâmetros e orçamentos que garantam qualidade na formação". O Simers também solicitou uma reunião com a reitoria e a direção da Famed.
A reitora da universidade respondeu à nota, afirmando que os Simers ainda não tiveram acesso a informações que fundamentassem suas críticas. "Percebo uma postura de oposição gratuita a uma iniciativa que busca enfrentar um grave e histórico quadro de falta de profissionais médicos que atuam em áreas geralmente negligenciadas", disse ela. "Por que o sindicato parte do orçamento de que a UFPel abandonará seu compromisso de construir uma universidade de qualidade e responsável pelos profissionais que forma?", questionou, ressaltando que o objetivo da universidade é contribuir com a sociedade através da formação de profissionais tecnicamente capacitados e socialmente responsáveis.
Foto: UFPEL.
Priscila Fagundes (estagiária sob supervisão de Paola Fernandes).